30.7.12

Sem querer

Sim, estou de férias. Sim, vou-me embora. Sim, a ninguém interessa. Sim, estou-me nas tintas. Sim, estou cansada. Sim, é preciso ter lata. Sim, a vida é muito mais simples do que a imaginamos. Sim, o mar é capaz de estar bravo e eu não quero saber. 
Sim, é um post parvo porque as férias me empurram para uma incapacidade que escolho sem querer.

25.7.12

O amor também se come

O senhor José era o dono da mercearia mais chique do bairro. Tinha por hábito fazer panquecas para os vizinhos do prédio e dizia bom dia com todos os dentes que lhe restavam. O homem das colheres de prata dizia que o amor também se come e a Maria, no dia em que percebeu que não recebia as panquecas do Sr. José por sair sempre cedo de casa, ligou ao homem das colheres de prata para lhe ensinar a fazer o amor que também se come.

24.7.12

Alta alma

A D. Alice é uma mulher baixa com uma alma muito alta. Quando alcança a mais lúcida das ideias, cresce com os pés no chão que pisa enquanto dança, respira com os pulmões com que canta, olha com os olhos com que chora e ri-se, ri-se muito porque gosta de perceber que, ideias lúcidas só as tem quem sente.

23.7.12

Agora vou ali.

Vim aqui só para dizer às pessoas que a minha vida me ocupa o tempo todo. Sei que se estão nas tintas, de qualquer forma ficam algumas frases a enfeitar um blogue, já de si, bonito. Apesar de ninguém querer saber, a minha consciência impele-me a enfeitar o espaço. O fim-de-semana acabou e amanhã levanto-me a horas inconstitucionais. 

O clima está quente e fresco ao mesmo tempo, a consciência está quente e fria. Agrada-me. As letras juntam-se para formar palavras que são jogo, para quem gosta de as juntar.
Nem sempre quem lê fica satisfeito mas essa questão está ausente, fora do alcance de quem joga.

O clima continua em maré de disparates. As letras são inúteis quando se combinam sem vontade. Que leiam os que nada têm para fazer. Que escrevam os que preferem dizer que a existência é um facto, só porque sim.

Agora vou ali comprar morangos.

19.7.12

David Brooks - O Animal Social

Amor não se pede


As pessoas têm manias esquisitas. Não sei ainda se, esquisitas são as manias ou as pessoas. Encontrei um marido a chorar porque a mulher o tinha abandonado e disse-lhe:
- Há abandonos que causam lágrimas definitivas, vai ver que essas são transitórias.
- As lágrimas?
- Sim, caem no chão e daqui a pouco estão secas.
- Mas o amor não seca.
- Quem lhe disse? Se o deixaram só, é porque o amor já secou. Levante-se e vá para a praia perceber que só o mar não seca.
- Quem está de fora tem sempre palavras, não é?
- Não, quem está de fora vê com maior nitidez.
- Eu amo-a, e já lhe pedi para ficar comigo.
- Ama-a? Então deixe-a ir para onde ela quiser, ou julga que amar é pedir?

18.7.12

Grito e silêncio


Foi-se embora no dia 1 de Abril, pareceu-me mentira. Não era. O dia 1 de Abril passou a ser o dia da maior verdade, o momento em que percebi a importância de uma mulher na vida de um homem. Nenhuma. Zero. Finito. Vazio.
A certeza do vazio finito adensou-se agora. Depois de tanto tempo ainda lembro os dias e as noites e os beijos e os gritos. Ela gritava muito enquanto eu lhe dava amor. Um dia disse-lhe que era melhor engolir o amor inteiro do que fazer aquele barulho ridículo. Respondeu-me com mais um grito e eu calei-me.

13.7.12

Bom dia consciente

Se um dia acordar dizendo bom dia, acordarei em cima de uma vontade de ferro. De manhã, a vontade é sempre de algodão. O dia bom vem depois de dez minutos de água e cinco minutos de respiração atenta. O dia bom é reconhecido após quinze minutos de existência consciente.

11.7.12

Coisas


Egon Shiele



















“A simplicidade é o último grau de sofisticação.” 
Leonardo Da Vinci

10.7.12

Litígios


- Vou-me embora.
- Não faça isso, sabe que gosto de falar consigo.
- Não estamos a falar.
- Estamos a escrever, é a mesma coisa.
- Não, não é.
Desligou o computador com a força toda nos dedos indicadores, aquele homem estava há uma hora a tentar convencê-la que era o João de Coimbra, o advogado das causas difíceis, o pai de família desorientado com um divórcio litigioso. Qual é o advogado que se desorienta com um litígio? Deixou-o a escrever sozinho, ou com alguém que quisesse acreditar em histórias. As histórias são bonitas, são bocados de vida que se vão buscar a gavetas escondidas, o problema é o pó que trazem agarrado, uma espécie de pó que adensa a imaginação e as faz rebentar como a um saco de plástico.