27.3.13

Dourada ignorância

Joaquín Torres García
















Queremos, a todo o custo, evitar o sofrimento. Percebemos depois que, sem ele, não seria possível a aprendizagem, uma boa dose de crescimento e uma maior capacidade de adaptação. Sem ele estaríamos livres da dor e encerrados numa espécie de ignorância dourada.

Quotidiano

Joaquín Torres Garcia

26.3.13

Saco cheio

Joaquín Torres Garcia



















Enquanto fazia o percurso, a minha cabeça era um saco cheio. Tentei pôr as ideias em ordem sem travar o raciocínio, quis perceber o fenómeno que vivia mas a dificuldade aumentava. Tentei relembrar todos os passos desde que o despertador tocou: desliguei-o; sentei-me na cama; calcei os chinelos; abri a janela e era noite, isso, era noite e o relógio marcava sete horas da manhã. Apenas alguns estabelecimentos tinham luz, algumas ruas mantinham candeeiros acesos, alguns semáforos funcionavam. A distracção fez-me parar quase em cima da traseira do carro da frente. - Está a olhar para onde oh parvalhona? - Ouvi gritar pelo vidro - Não liguei. O caminho para a escola foi feito entre as poucas luzes que os geradores mantinham acesas e alguns semáforos intermitentes que, com cautela, tive que atravessar.
Ao portão estava o Sr. Vítor, sempre atento aos professores e aos alunos:
- Bom dia, Dra.
- Bom dia, Sr. Vítor, sabe dizer-me o que se passa hoje? Estou assustada.
- Porquê Dra. Teresa?
- Por nada, Sr. Vítor, por nada.
Entrei no edifício quase às escuras. Senti as vozes dos colegas na sala de professores e o barulho dos alunos que entravam nas salas de aula. A boca estava seca. Fui ao bar pedir um copo de água à D. Rosa, atendeu-me com uma vela acesa no balcão e com a naturalidade do costume. Abri a boca de espanto e ela riu.

Tempos

Joaquín Torres Garcia

23.3.13

Centrifugação

Não me quero ir embora sem perceber as coisas que me centrifugam os neurónios, esses seres malévolos em dias de tempestade e encantadores em dias de sol. Quando me vou embora sem perceber as coisas que me centrifugam os neurónios, caio no primeiro degrau que encontro e magoo tudo o que está cá dentro, excepto as dúvidas teimosas.

22.3.13

Promessas

Quando as noites prometem, convém ficar atenta ao ruído surdo que vem do escuro, não vá uma pessoa perder pitada do importante e grande parte do detalhe que teima em provar que existe.

9.3.13

Quando os pés não calçarem luvas

As meias horas cortadas em partes iguais de adiamento foram postas em suspenso. Quando a campainha tocar, quando o copo se encher, quando as mãos encontrarem as verdades postas debaixo do tempo, quando tudo parecer ainda mais nítido, quando os pássaros vierem dizer que pode ser dia, quando pensarmos que o dia é igual à noite, quando a vida tomar partido da lucidez que sustenta todas as ideias transformadas em pingos, quando a cama ficar cheia de lençóis e a sala ficar cheia de música, quando terminar a respiração adiada, quando tudo voltar ao agora, quando se entender a clareza com o gesto, quando os pés não calçarem luvas, quando as mãos afastarem as meias, quando o colo for suficiente.