27.9.14

É muito

Não vou ser mais que aquilo que sou, sê-lo significaria explodir. Ser mais do que sou é como ter mais tralha do que espaço, saltar por cima, tropeçar e cair, fazer do espaço um atafulhamento de mim. Não vou ser mais nem menos do que sou porque a balança deve estar com o fiel afinado, arranjado, equilibrado, pacífico e absolutamente ele. E agora? Não cresço? Agora cresço com o que faço a partir do que sou, sem transbordar o tacho que me deram e com o qual cozinho os ingredientes que invento. É só isso? É muito.

Tiago Taron

8.6.14

Perda antecipada

A palavra "tentar" sempre me soou a perda. Quem a usa perde com honra. Tentar ir, tentar fazer e tentar dizer deixa-nos numa espécie de inércia consentida, sempre com vista a um não adiado, a uma recusa que, à partida, já se tinha assumido. Vamos todos tentar, ou seja, vamos todos viver com esforço e com pouca vontade.

3.5.14

Tretas

Autor que não foi possível identificar

















Nunca gostei do Verão, nem do Inverno. Devo ser das que, na luta pelo equilíbrio, perde tudo. Extremos complicam-me a vida. Gosto do morno, de quando posso descalçar-me sem que os pés me fervam, de quando posso despir-me sem que a temperatura me gele. Nunca gostei de branco e o preto está-me perto, mas isso irrita-me.


26.4.14

Sem sentido

Não tenho procurado, nas palavras, nada que me interesse. Ando nua de palavras, cheia do deserto que me desperta para nada. Depois toco as coisas que não são como se fossem, e as coisas que são como se não existissem. Não tenho procurado mais porque não tenho mais que procurar. Encontro o que aparece. Coisa confusa, esta. Como eu.

7.2.14

Viagem

Vim de perto e de muito longe, fugi de alguma coisa que, de não minha, ficava lá, fora do que sou. Agora encontrei-me, apenas porque tomei nota, atenta ao longe que quero encontrar.

3.2.14

Armário

Andy Warhol
















O corpo é uma espécie de armário cheio de coisas vividas. Arrumá-las é preciso, porque o corpo desarrumado fica com o cansaço posto dentro dele, e depois respira pouco.


26.1.14

Dobras e Gritos (54)

"As coisas que nos assustam são em maior número do que as que efectivamente fazem mal, e afligimo-nos mais pelas aparências do que pelos factos reais."

Séneca; Cartas a Lucílio

18.1.14

Vincos na existência

Há momentos na vida que ficam vincados, e isso faz-nos engomar as horas quando é preciso parar e perceber o mundo e os dias que experimentamos. Há palavras que nos empurram para realidades pouco conhecidas. Fora da zona de conforto encontra-se a magia que a vida precisa para acontecer. Há meses que entrei numa zona desconhecida. A Programação Neurolinguística (PNL) é uma área de estudo e crescimento pessoal muito mais ampla do que a própria vida. Julgamos ter o mapa todo explorado e percebemos que muitos caminhos estão por viver. 
 
Num sétimo andar em Lisboa, acontece a magia. Entre o inconsciente e a consciência, entre o corpo e o movimento, entre pares que querem viajar connosco, descobre-se que a viagem é longa, descobre-se o que sempre esteve cá dentro. Se todos temos os recursos de que necessitamos para sobreviver no sistema, vamos encontra-los, descobrir as perguntas certas, fazer os exercícios que o corpo permite e a alma encontra. 

A PNL é a viagem mais bonita que fiz até hoje, não porque se encontrem só coisas belas, mas porque se encontram todos os caminhos possíveis a uma mudança de rumo e, quando se quer mudar de rumo, é preciso que a vida aconteça e, se é preciso que a vida aconteça, que se ponham os pés ao caminho e a cabeça siga levantada frente ao espelho que somos e do qual fugimos, quando acreditamos poder fugir de uma evidência.

5.1.14

Luzes regressam às gavetas

Depois é a preguiça do corpo que se levanta devagar, o entorpecimento e tudo o que deixou os sentidos parados. Depois das luzes regressarem ao lugar de onde não deviam ter saído, os pensamentos demoram a ocupar o lugar que têm por direito. No decorrer do marasmo que se instalou, vêm os remorsos pelo que não se produziu. Pior ter morrido.

4.1.14

Luzes fora das gavetas

As épocas transformam as atitudes. São períodos de tempo que me desconcertam. As épocas têm poder e isso irrita-me. Como se o tempo, dentro da consciência, fizesse saltar o que estava quieto, desorganizar o que estava arrumado. Gosto de arrumações, não gosto de épocas que põem tudo fora do lugar. As luzes saem das gavetas, os bolos ingerem-nos e os papéis devoram-nos. As épocas tiram-me a rotina e isso desalinha-me o corpo. Fico doente dos olhos e os braços caem perdidos, sem ter onde pousar. Fico turva de sentimentos e as pernas prendem passos que se querem compridos. As épocas transformam as atitudes e isso põe-me doida de espanto e espera. Vou aprender a viver épocas, antes que elas me levem aos abismos profundos da pouca lucidez.

Jackson Pollock