Saí com a mochila posta nas costas. Era tarde de chuva em Lisboa. Passeei entre os pingos grossos que me levavam a lugar incerto. As montras estavam limpas. Olhei-as com desdém. Largo do Chiado vazio de pessoas, cheio de gente ocupada. Tinha nas mãos coisa nenhuma e no entendimento a alegria de algumas produções escritas que, pela primeira vez, tinham tido retribuição simbólica. Sabia que aquela quantia estava nas mãos de quem precisa de uma coisa com importância, para ficar acima do tempo.
Desci as ruas de calçada com a dúvida fora de mim. Lisboa ia oferecer-me, naquele dia, um objecto que contasse as histórias das minhas noites com a chávena de chá verde.
Depois de muitos passos, perto do largo de Camões, parei em frente a uma loja de chás. Verdes, brancos, pretos. Entrei. A senhora sorriu e indicou-me um lugar perto do vidro molhado. O chá foi servido com as mãos de quem sabe e a ampulheta que conta os minutos desejados até chegar o aroma e o sabor que se procuram devagar. Bebi-o com os olhos postos no bule. Encarnado, quadrado, pesado e quente. Sabia-o meu, fruto das palavras que tantas vezes ofereci. Peguei nele com a convicção de que iria fazer parte da melodia dos meus parágrafos. Levantei-me e paguei, com o contentamento de quem, pela primeira vez, paga uma relíquia com o fruto dos seus solitários momentos de criação.
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