3.4.09

I HAD A DREAM



Era uma vivenda num bairro ajardinado e limpo. A entrada dava acesso a uma sala em tons de encarnado esmorecido, mais ou menos velho. Poltronas de veludo gasto e bonito, enormes bancos rente ao chão convidavam quem chegava a sentar-se confortavelmente. A dona da casa distribuía elegância e bom senso. Palavras ditas em inglês que eu ia percebendo mal. O marido, homem bonito e com classe, convidava-me a sentar num gesto amigável e quente. Parecia que nos conhecíamos há muito. Visita regular da casa, eu era recebida em jeito informal, como se não fosse preciso muito tempo para entender a amizade que nos unia. As filhas estavam de férias com os avós, a minha e as do casal. Três meninas que conviviam como irmãs e que, muitas vezes, partilhavam os mesmos brinquedos.

Sentei-me na poltrona que me reservavam e fiquei em frente ao dono da casa. Tentei falar um inglês compreensível de modo a ser entendida. Ele ria das minhas “concordâncias gramaticais” e afirmava perceber-me, ao mesmo tempo que ia pronunciando lentas palavras em português. Dizia que tinha aprendido em pequeno, com amigos filhos de emigrantes que, na escola, lhe tinham ensinado “pois”, “claro”, “com certeza”, “obrigado” e “boa noite”.

Assim nos íamos entendendo enquanto a senhora mandava preparar um chá verde sabendo-me apreciadora do líquido quente e desintoxicante. Os três em frente a uma lareira alta que iluminava a noite desenrolávamos ideias em cima do riso. Ele, alto, bonito e inteligente, fazia-me sentir a urgência da reflexão sobre o mundo, sobre a economia, a fome, a guerra e o desenvolvimento sustentável. Ela, mulher de elevada classe, fazia-me entender que as escadas se devem subir devagar, desde o primeiro degrau, sem pressa de chegar ao cimo porque, de lá, se podem sentir vertigens.



O serão atravessou horas de beleza e tranquilidade. A dada altura, o dono da casa pediu para sair, tinha que retomar um trabalho importante no escritório do primeiro andar onde se recolhia sempre que compromissos políticos o chamavam. Ela ficou, mastigando bolinhos de areia comigo, cúmplices, amigas e mulheres. Continuei sentada a conversar com Michelle, enquanto Barack Obama cumpria, no andar de cima de uma casa que não era branca, compromissos oficiais importantes.

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