25.1.09

JUSTINE


Magritte

“ A nossa cabeça – dizia ela – é querer explicar tudo dentro dos quadros da psicologia ou da filosofia. No final de contas, Justine não tem de ser justificada ou desculpada. Ela, simplesmente e magnificamente, é. Devemos aceitá-la assim mesmo, como aceitamos o pecado original. Chamá-la ninfomaníaca ou introduzir o freudismo aqui, meu caro, é privá-la de toda a substância mítica – a única coisa que ela realmente possui” (Laurence Durrell; Justine. Quarteto de Alexandria).

O amor misturado com ideais, confundido com expectativas, resvala na berma da solidão. Interessam-nos os dias, as noites, a cama, a refeição, as férias e os beijos. Queremos que o amor se submeta às exigências pessoais, aos caprichos e desejos íntimos inconfessáveis. O amor certinho, onde tudo encaixa como íman em porta de frigorífico. A cama feita e o corpo cheiroso. O carro cheio de alegria ao domingo e os cabelos arranjados para a festa.

As mulheres esperam protecção, ajuda, amparo, presença, segurança e competência sexual. Aos homens, é-lhes prometida a mulher que pouco fala, a submissa, a que depende e espera, a que cuida, a que grita na cama e é senhora à mesa. Amor viciado e cabeças abarrotadas de esperança.

Justine gritava e amava o corpo que lhe pedia prazer, entregava-se à vida e ao tempo com a consciência do amor que advém da comunhão de espíritos e de pensamentos. Acreditava no que explode dentro de almas independentes que se fundem para se expandir. Amor sem espera. O amado que vive experiências iguais às minhas, o que fala sobre a mesma beleza, o que me permite a comparação entre duas vidas, como a mesma imagem vista em espelhos diferentes. Amor que precede o primeiro olhar, o primeiro beijo, o primeiro contacto, precede as primeiras declarações que assinalam o ponto de viragem porque, a partir daí, degenera em hábito, em posse e em solidão.

Justine sabia que “uma cidade pode tornar-se um universo quando estamos apaixonados por um dos seus habitantes”. Sabia a verdade: ser mulher forte impedia-a de ser verdadeiramente amada. Privar-se de si levava-a ao encontro de mais um amor pequeno. Era disso que fugia.

1 comentário:

Henrique Dória disse...

Vim aqui, a partir de Rothko.Excelente blog.Deixo cnvite para visitar odisseus.blogs.sapo.pt

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