(...) Ser gaja não é para todas. Só quem passa por testes sucessivos de vida pode merecer um nome macio e sedoso. A gaja é sempre a mulher que está perto, a amiga íntima ou a companheira de viagem. É, também, aquela que confidencia e ouve confidências, a que fala a noite inteira antes do sono anunciado e, sempre adiado. A gaja com quem se vai ao cinema, com quem se divide o gelado, passeia de mão dada na marginal ou com quem se dorme, porque dormir com a gaja é a tradução física de cumplicidades trocadas todos os dias. A gaja está sempre lá, atende o telefone a qualquer hora e ouve palavras sem tempo marcado. É preciso, para ser gaja, estar e ser disponível. Anos a fio de saídas, jantares, segredos, vidas trocadas, lençóis mudados, canções ouvidas, suor dividido, concertos sem hora para acabar. O gajo, o que oferece o nome à gaja, existe desde que ela entrou na escola e dividiu a carteira com ele, a borracha emprestada, o afia lápis no estojo alheio, a aula de Educação Física em que as cavalitas de um são as do outro, os abdominais que se dividem sob o disfarce de esforço solicitado. A gaja e o gajo estão lá, na estrada longa da vida, lado a lado. Às vezes ficam quietos, calados, olham um para o outro como se soubessem tudo. Nada para dizer para além dos olhares quase adivinhados. Eles sabem o que querem, o que pensam, o que não desejam e para onde vão. São os gajos mais porreiros da escola e ninguém os vê separados. As noites de estudo são rotina, o café feito antes do sol nascer, Elis Regina no gravador pequeno trazido de Andorra e muitas palavras escritas nos cadernos da faculdade.Para se ser gaja tem de se ser história na vida do gajo e, só para ele, o nome se aplica. Qualquer “transeunte” que pense apelidar a menina com o exclusivo nome que o gajo lhe ofereceu, pode ser levado tão a peito que, deslize para a mais ténue das indiferenças.
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