30.3.11

MARIA

A Maria adorava reunir, convocava os colegas como quem envia convites para festas. Era um prazer encher a mesa de folhas, informar sobre aquilo que poderíamos ler em casa no e-mail, encetar diálogos vazios e fazer pouco mais que coisa nenhuma durante duas horas. Há muitos anos que eu conhecia a Maria e a sua obsessão por reuniões. Vivia sozinha num apartamento com quatro gatos e a sua vida era pouco mais que o emprego e as compras de super-mercado. Era uma mulher baixinha, sem pescoço, com o queixo ligeiramente curvado na direcção do nariz e uma capacidade de síntese igual à dos secretários de estado. Presidia às reuniões como quem preside a uma importante assembleia, com a seriedade posta no rosto, a responsabilidade em cima dos ombros e a postura cheia de uma importância que não existe, considerava o seu cargo parecido com o de um monarca que tem que tomar decisões sobre o futuro de um país.
Todos percebíamos a necessidade de afirmação da Maria, todos a ouvíamos com atenção, ela ficava contente quando as pessoas olhavam para o vazio das suas palavras. Em dias de reunião levava sempre o batom nos lábios e o colar no pescoço. Era espessa a expressão que fazia quando nos interpelava sobre questões pequenas.

4 comentários:

-pirata-vermelho- disse...

PALMAS!
(coisa barulhenta que não uso na música)
o seu texto é muito bonito
e aplica-se... o conceito defraudante, consagrado e aceite na expressão 'reunir'.

Para meu espanto recebi recentemente,em resposta a uma informação crítica, uma mensagem em que se anunciava que o sr vice-presidente -da Câmara-se encontrava disponível 'para reunir'.
Fiquei de boc'aberta e repliquei imediatamente que osr vice estava lá, ali, para prover e informar célere, não para reunir qiue não produz nada.
A Runião é uma das mais torpes instituições desta terra falida e dela deriva a reduzida produção das organizações em que trabalham 'marias'.

'Tocar a reunir' era na tropa e a tropa formava e avançava para fazer qualquer coisa; não era para falarejar...

Anónimo disse...

As reuniões servem para coisa nenhuma, ou porque quem as dirige, dirige as pessoas para o caos informativo ou porque nada há a falar que não possa ser resolvido com um telefonema ou mail. Mas como os portugueses não entendem mais que o que se lhes coloca à frente do nariz.... toca a reunir para disfarças incompetências.

Anónimo disse...

onde se lê "disfarças", deve ler-se "disfarçar".

Anónimo disse...

;) Maria!

Enviar um comentário