Eu era muito pequena. Na rua estreita vivia, no final de uma descida íngreme e sombria, uma vizinha que passava os dias com a mãe atrás de um balcão cheio de tarecos. Eram tachos, canecas, pratos, bonecas, talheres, vassouras, piaçabas e tampas de sanita ao pé de baldes. Era a minha vizinha das músicas, das letras e das brincadeiras no degrau de pedra baixinho onde me sentava para cantar. Eu usava bibe às riscas para não sujar o fato domingueiro. Ligávamos o rádio perto do ouvido e cantávamos como se não houvesse nem ontem nem hoje nem amanhã. Não podia imaginar que, passados trinta e cinco anos, um aluno me ofereceria o disco. Hoje, sem bibe, sem vizinha e sem rua estreita, a memória fica como se o tempo não tivesse qualquer importância.
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