13.2.09

MIGUEL


Ela dizia-o antes que falasse. Ele lia-a antes que olhasse. Os dois, em Lisboa, pouco sabiam da vida um do outro. Encontros eram comuns. Em casa dela havia chá. Em casa dele vinho tinto. As taças de ambos tinham sido compradas longe, na cidade da luz maior.
As viagens eram solitárias. Os dois preferiam a não companhia. A nudez era partilhada em Lisboa. Apenas.
Miguel tinha a mania das conversas à lareira. No Verão, o clima quente não o fazia desistir do mesmo lugar. Cadeirão em frente ao espaço apagado e escuro. O quadro de Vasarely na parede branca chamava-o, mesmo quando a temperatura subia. Luísa podia, ou não, estar com ele. As conversas que dispunha na taça de vinho eram silenciosas, quando um livro era o interlocutor. Agradável ruído acontecia quando, além do vinho, Luísa se sentava em frente ao quadro e percebia que, para lá das cores, o movimento podia levá-la longe no pensamento. Miguel sabia-a distante e isso despoletava mais o desejo que sempre acontecia entre duas pessoas. Uma em frente à outra.

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